17.08.2007 | Histórias
Uma História de Páscoa foi publicada inicialmente na revista Recreio, em março de 1971, ilustrada por Canini. Depois saiu em livro, em 1977, com ilustrações de Rogerio Borges, como um dos quatro contos que integravam o livro Currupaco Papaco e Outras historias, um dos três títulos de Ana Maria Machado que integravam a série Histórias de Recreio. Em 1982, sempre pela Editora Abril, veio nova edição, de luxo, com capa dura. E alguns anos mais tarde, ganhou roupagem totalmente nova em outra casa: num formato pequenino, fácil de caber em mãos infantis, a Record republicou o livro - dessa vez com ilustrações da dupla Denise & Fernando.
"Foi uma pulação. Foi uma Gritaria. O jardim ficou cheio de uma grande alegria.
-Oba! Oba! Chocolates! Ovinhos! Bombons! - gritava Joãozinho."
Detalhe de ilustração de Canini para a Revista Recreio, Editora Abril, 1971 (Canini)
Só muito depois é que a Salamandra resolveu fazer a Coleção Batutinha e publicar separadamente os 12 contos que um dia tinham feito parte da série Historias de Recreio. E em 2000, Uma História de Páscoa ganhou autonomia, com 24 páginas totalmente em cores, ilustradas por Gonzalo Cárcamo.
Ana fala do livro
“Quando eu fiz essa história, ainda publicava apenas na Revista Recreio e tratava de atender a uma encomenda - um texto que falasse de Páscoa. Mas já estava escrevendo havia mais de dois anos, me sentia com alguma segurança, e resolvi aproveitar para fazer uma experimentação, já que o tema era determinado, me dei o direito de tomar muita liberdade com a forma. E resolvi construir um livro que fosse espelhado. Isto é, bem simétrico, como quem se olha num espelho, alternando os pontos de vistas dos dois protagonistas - o menino e o coelho. Ao fazê-los ficar bem parecidos, comportando-se de forma semelhante, a história passou a igualar realidade e fantasia. Com isso, a fantasia passou a lançar dúvidas sobre a a realidade.
Acho que essa era a grande dificuldade que eu tinha de enfrentar numa história com esse tema: como conseguir, ao mesmo tempo, não destruir nem reforçar a idéia de que um coelhinho de Páscoa traz ovos de chocolate? O jeito foi brincar e deixar um mistério suspenso - com a promessa de que, quando a criança crescer mais um pouco, as coisas se resolvem. E uma piscadela de olho para as que já cresceram.
Por outro lado, essa estrutura me permitiu também acrescentar um elemento novo, que é muito mais freqüente no Natal do que na Páscoa. pelo menos, para as crianças. Ou seja, a troca de presentes. A alegria de fazer algo para um amigo.
É uma história muito simples, para crianças pequenas. Até recentemente não teve vida independente. não ganhou prêmios, não foi traduzida, nunca teve uma resenha ou crítica de ninguém. Mas a experiência de escrevê-la me ensinou muita coisa sobre os mistérios da escrita, me mostrou como a forma pela qual a gente estrutura um conto ajuda a revelar coisas profundas.
Ana Maria com um coelhinho de pano feito por sua avó. (Arquivo Pessoal)
Além disso, há também uma coisa afetiva muito boa na minha ligação com esse livro. é que tenho lembranças ótimas da páscoas de minha infância. geralmente passávamos em Petrópolis, em casa de minha avó paterna. Como a cidade teve uma imigração alemã muito significativa, essa influencia marcou os costumes locais. Não se escondiam os ovinhos - costume que só vim a conhecer muito depois, ja adulta, quando percebi que festejava a Páscoa com meus filhos de modo diferente dos colegas deles. Lá em casa as crianças faziam uns ninhos na véspera, em cestinhas ou tampas de caixa, forrados com musgo, grama ou palha e enfeitados com flores, fitas e papeis coloridos. Deixavam tudo preparado e iam dormir. No dia seguinte, eles estavam cheios de ovos e balas. Ovos de chocolate e ovos cozidos, de galinha, pintados em diversas cores. Além disso, o café da manhã era chocolate quente, tinha bolo em forma de coelho, a mesa toda enfeitada. Um ano, a minha avó soltou filhotes de coelho dentro de casa e quando acordamos foi uma festa.
Quando cresci um pouco, passei a ajudar os adultos a preparar os ovos para os irmãos menores. Ficávamos até tarde na cozinha pintando com anilina, dividindo as balas e ovinhos miúdos de chocolate para todo mundo ganhar igual, essas coisas. Era muito divertido e eu me sentia muito importante.
E a essa altura, como eu já tinha feito a primeira comunhão, havia um complicador. Justamente no dia do café da manhã mais tentador do ano, eu precisava ficar em jejum - porque devia fazer a Páscoa. Isto é, comungar naquele dia. E só podia comer quando voltasse da missa. Mas aí, descontava...”
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